a coroa do homem

imagine o último ser; só há a imaginação e eu. sinto-me um libertino: expulsaram-me do reino dos homens. agora não pertenço mais à seu território. almejo a casa vazia. no caminho há árvores maiores que eu, como os homens de meu reino, há encostas e barrancos que estão à ceder, os pedregulhos descem e eu corro como o último ser da terra. neste caminho me encontro com outros homens perdidos de si mesmo: alguns se perderam de seus exércitos, outros perderam seus filhos e outros foram deixados por suas esposas. gosto de alguns. sinto apreço e desejo por aqueles que são homoeróticos como eu, filhos de São Sebastião. gosto de vê-los nus, tocar seus pênis e lançar meu corpo ao desejo mais profundo que há em mim. esses homens são como mulheres ao tempo que não o são feminino-masculino. são como eu, estranhos e sujos. perpétuos de si em um mundo de estranhos. no caminho há ilhotas e acampamentos para os homens perdidos. só há homens. o reino dos homens. as mulheres vivem junto aos feudos do norte. nós, homens exilados, perpetuamos a densa floresta que atravessa o sul. nessas florestas não procriamos, cultivamos o destino mortal. com o tempo eles me coroaram rei. sou homus, sem qualquer pronome que me faça ver. os dias passam e me deito com mais rapazes, aqueles que me recordavam as mulheres que amei. ao trovejar do quarto ano fui-me embora. são leste havia a garganta: lá viviam as mulheres. embarquei em minha jornada, o rei abandonou seus súditos. adentrei em um deserto arenoso e úmido, como um reino de sombras. travei batalha com criaturas de um olho só, ciclopes sem pênis e minotauros sem vulva. me alimentava de meu próprio sangue. passei 40 noites conversando com João Batista. Batista e eu reencarnamos após nossos pecados. ao travar todas as batalhas, atingi o grande portão da garganta e uivei: sem teu amor e lábios não posso viver, Santa Rita.